Amar

de Florbela Espanca

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui...além...
Mais este e aquele, o outro e toda a gente...
Amar!Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disse que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar.

E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder...pra me encontrar...

Montanhas

O que separa os centros
São os grandes espaços
Ao longe pairam montanhas no horizonte
cobertas de névoa
Parecem recortar do céu a terra
como se não fossem deste mundo

O Maior Bem

36 primaveras e foi-se ela
na mesma idade quando me assumi poeta
Antes dela pousar como o orvalho em meu jardim
Fez-se Neruda e Quintana
meu maior bem:


"O Maior Bem"

(de Florbela Espanca)

Este querer-te bem sem me quereres,
Este sofrer por ti constantemente,
Andar atrás de ti sem tu me veres
Faria piedade a toda gente.

Mesmo a beijar-me a tua boca mente...
Quantos sangrentos beijos de mulheres
Pousa na minha a tua boca ardente,
e quanto engano nos teus vãos dizeres!...

Mas que me importa a mim que me não queiras,
Se esta pena, esta dor, estas canseiras,
Este mísero pungir, árduo e profundo

Do teu desamor, dos teus desdéns,
É, na vida, o mais alto dos meus bens?
É tudo quanto eu tenho neste mundo?

Bonecos de Cera

Olhares ficam a vagar
e mergulhas a cada turba
buscando um outro olhar

Quem é você,
anjo demoníaco ou
demônio angelical?

Tome cuidado para não se perder
não existem leis que se encaixem
com seu modo de ser

Estão todos a controlar
o que você faz ou deixa de fazer
Alguns ainda querem se aproveitar
da sua inocência
que parece loucura
para aqueles ditos medíocres

Imagens caem
líderes são enforcados
e o mundo se divide mais uma vez
e continua se enganando
com toda estupidez

Fuja, corra!
Se ficares aqui vais acabar
fundido com os outros
iguais bonecos feitos de cera